quinta-feira, 17 de março de 2011

Os Sobreviventes Autor: Alberto Grimm ( parte final)

Com o tempo, às gerações sobreviventes desenvolveram a capacidade de se adaptar a tais condições ambientais, assim como a de enxergar na escuridão quase total. Graças a isso, ele podia enxergar a cidade do ponto onde agora se encontrava. Não estava sozinho, dois amigos o acompanhavam. Aquela cidade por muito tempo ficara de quarentena, e só nos últimos cinco anos, as autoridades haviam permitido aos sobreviventes, pouco a pouco, a retornarem para tentar recolonizar o lugar. Como ainda era uma situação incerta, o governo criara incentivos especiais para aqueles que desejassem estabelecer moradia no local. Cada um receberia um bônus alimentação, suporte à moradia, e um emprego vitalício, onde estaria garantido por toda vida, um cargo de supervisor especial da secretaria do meio ambiente.

O trabalho de cada um deles era simples. Deveriam se estabelecer no local, e ao mesmo tempo explorar as regiões mais próximas, efetuando medições dos níveis de poluição ambiental ainda existente. Feito isso, deveriam manter informadas as autoridades, através de relatórios mensais. Para tornar a tarefa possível, cada supervisor receberia um medidor portátil, que seria usado para coleta, análise e posterior compilação dos dados, que seriam transformados nos relatórios. O treinamento necessário para se tornar um supervisor, incluía lições de sobrevivência a ambientes de extremo risco. Assim, aquele pequeno grupo, na verdade representava uma força de elite dentre os sobreviventes. Esse cuidado excessivo tinha uma razão de ser. Aquela não era uma cidade comum, já fora um local temido por todos antes da destruição; uma verdadeira lenda viva do pavor; o argumento preferido das mães para assustar filhos desobedientes.

Como cenário das lendas mais temíveis, diziam que monstros de caudas longas comedores de crianças, eram seus habitantes mais amistosos. Eles próprios lembravam claramente quantas noites ficaram sem dormir, pois suas mães diziam que crianças que cometessem alguma traquinagem, ao dormirem seriam levadas para lá. Desse modo, sabiam agora o motivo das lendas criadas sobre aquele lugar. Havia de fato uma zona proibida, da qual ninguém, sob nenhuma justificativa, deveria se aproximar, e esse era o motivo. Eles agora conheciam o motivo, pois nas primeiras tentativas de repovoar a cidade, dezenas de grupos haviam desaparecido misteriosamente naquela localidade. Só depois de muita pesquisa, de consulta de antigos mapas da região, é que haviam descoberto a causa. Para as centenas de pioneiros que no passado, disso ainda não sabiam, nada mais poderia ser feito; mas para as futuras gerações, havia uma chance, desde que o local fosse devidamente isolado.

Essa também era uma de suas tarefas, era uma missão secreta, por isso tanto treinamento recebido. Nunca poderiam revelar a mais ninguém o que lá encontrariam, e deveriam assim, definir os limites, até onde os futuros habitantes do lugar teriam permissão de ir. Assim, todo cuidado ao se aproximarem da zona proibida, era pouco. Usavam roupas especiais, e máscaras contra qualquer tipo de toxidade ambiental. De certo modo, não havia outra preocupação em explorar aquela cidade fantasma, pois nenhuma outra forma de vida inteligente conseguira mais se desenvolver diante de tão inóspitas condições, assim não precisariam temer eventuais seres inamistosos.

Eles eram sem dúvida, a última espécie inteligente sobre o planeta, graças a sua espetacular capacidade de adaptabilidade, aos mais extremos desvios climáticos. Bem treinados, prontos para sobreviverem ante as mais precárias condições, bem equipados e cautelosos, seu único inimigo era sem dúvida a temida zona proibida. Por isso mesmo, quando se aproximaram do local, uma grande tensão era evidente em todos. Era uma visão assustadora, aqueles altos muros de pedra negra, parcialmente destruídos pela erosão da chuva ácida, a esconderem em seu interior, o motivo dos maiores pesadelos daquela civilização. Eles podiam ler um nome na fachada do prédio principal; daquilo que um dia já fora uma fábrica, a maior do mundo na fabricação de um produto chamado inseticida.

Era uma visão temível; mas eles como os melhores dentre os melhores da sua espécie, não podiam se deixar levar por antigos temores; afinal de contas, tinham uma importante missão a cumprir. Podiam ler o nome que milagrosamente resistira quase intacto à destruição do prédio. E um deles leu a palavra da fachada em voz alta: "DETEFON"[2].

E o chefe da equipe engoliu um seco e disse: "O medidor informa que a área ainda é altamente tóxica, para nós, as baratas. Felizmente estamos com roupas especiais e máscaras".

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